Giro Cultural: breve panorama do Império Persa

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8 min readAug 31, 2022

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Texto por: Maria Helena Oliveira Soté

No período anterior à Cristo, o Oriente vivia em uma constante resumida no surgimento e declínio de grandes impérios em um intervalo curto de tempo. No entanto, houve uma civilização, conhecida por ser a mais honesta do mundo, capaz de romper com esse paradigma e não só sobreviver por mais de 200 anos, mas também se expandir constantemente e tornar-se um dos maiores e mais importantes impérios vistos pela História mundial: o Império Persa, que teve seu nascimento, auge e declínio, aproximadamente, entre 559 a.C e 331 a.C.

Na imagem: mapa do Império Persa

Contudo, antes de adentrar nas conquistas territoriais e singularidades do Império Persa e seus governantes, é pertinente mencionar que a Paarsa, ou terra dos persas, já existia desde meados de 600 a.C. Porém, naquele período, sua configuração se assemelhava com uma confederação de clãs, sem uma unidade centralizadora definida. Isso só acontece com o surgimento de uma figura excêntrica e ambiciosa, Ciro, o Grande. (HOLLAND, 2008)

Na imagem: Ciro, o Grande, imperador persa

O destaque e a particularidade de Ciro e sua vida se encontram desde antes de seu nascimento. Reza uma antiga lenda que o rei da Média, seu avô Astíages, sonhou que seu futuro neto, filho de Mandane, colocaria em risco a existência de seu reinado e que, portanto, deveria ser assassinado assim que nascesse. Entretanto, Harpago, o encarregado de tal execução, abandonou o recém nascido próximo a uma montanha, o qual foi encontrado e criado por um pastor. Anos depois, Ciro, o herdeiro medo renegado, retorna como Rei da Pérsia e enfrenta seu avô em uma batalha que, aparentemente, seria invencível. No entanto, o monarca medo foi traído por Harpago, o encarregado por assassinar seu neto, e, por essa razão, sai do confronto como perdedor e prisioneiro (HOLLAND, 2008).

A partir da tomada de Média e, principalmente, após a difícil invasão e conquista da Líbia, Ciro iniciou seu projeto de expansão por todo o Oriente Próximo. Como consequência de seu planejamento e inteligência, em seis anos, o Império Persa tornou-se a maior potência mundial. Sob outra perspectiva, vê-se outras particularidades de Ciro, essenciais para sua popularidade e fama, como bondade, ao poupar a vida dos seus prisioneiros políticos, brandura, sensatez e tolerância, especialmente no que tange à concessão da liberdade religiosa e cultural aos povos dominados. Consoante Tom Holland, em “Fogo Persa” (2008), “a estratégia de Ciro sempre foi ameaçar seus inimigos e dar segurança a seus escravos”. Além disso, conforme exposto por Jean Steinmann, em “O livro da Consolação de Israel e os profetas da volta do Exílio” (1976):

Ciro não somente respeita os vencidos, sua língua, suas instituições, sua religião e seus bens, mas, embora estabelecendo solidamente seu poder, quer que este apareça liberal e libertador. Evita os massacres, os incêndios e as deportações. Política de anexação que contrasta absolutamente com a crueldade das conquistas assírias e mesmo babilônicas. (STEINMANN, 1976, p.56).

Sob a mesma perspectiva, John Bright, em “História de Israel”, afirma:

Ciro foi um dos governantes realmente de visão dos tempos antigos. Em vez de esmagar o sentimento nacional com brutalidade e deportações, como faziam os assírios, seu intento era permitir que os povos sujeitados, tanto quanto possível, gozassem de autonomia cultural dentro da estrutura do Império. (BRIGHT, 2003, p. 490)

Dominou os jônios próximos ao Mar Egeu, o território originário do povo persa, também chamado de “lar dos arianos”, as terras que iam do Hindu-Ksuh ao mar de Aral, a nordeste, o sul do Iraque, da Assíria ao Golfo Pérsico e pôde tornar-se o Senhor do Mundo. Devido a uma batalha em 529 a.C, ao norte do Jaxartes, Ciro foi morto aos 70 anos e o cargo de imperador do Império foi ocupado por seu filho mais velho, Cambises. É interessante mencionar que, antes de falecer, Ciro orquestrou a melhor conjuntura que evitasse desvio de poder e instabilidade no império, pois, além de destinar cargos de alto escalão para os dois filhos homens, também ordenou que estes, a saber, Cambises e Bardiya, se casassem com suas irmãs, Atossa e Roxana, de modo com que a linhagem sanguínea fosse protegida (HOLLAND, 2008).

A marca deixada por Cambises no Império Persa foi a planejada conquista do Egito, em 525 a.C. Por meio de uma atuação direta do imperador na investida e uma combinação eficaz de exército e marinha, os persas conseguiram entrar na terra do ouro e das pirâmides e se fixar, embora tenham enfrentado muita oposição, tanto dos egípcios quanto de alguns clãs da nobreza persa, que ansiavam por retirá-lo do poder e substituí-lo por seu irmão. Na tentativa de retornar à Pérsia para garantir seu posto como imperador, Cambises sofre um acidente e vai à óbito sendo, assim, sucedido por Bardiya (HOLLAND, 2008).

Entretanto, o governo de Bardiya não foi bem sucedido como o de seu pai e irmão. Como mencionado, a nobreza já estava descontente com a atuação imperial, e a situação foi agravada após o filho mais novo de Ciro confiscar propriedades de seus opositores e planejar uma reforma tributária impopular. Por essa razão, sete nobres, contrários a Bardiya, orquestraram e efetivaram seu assassinato. Seu sucessor foi Dario I, um dos conspiradores, que, embora não fosse da linhagem sanguínea de Ciro, também foi nomeado como “Grande”.

Na imagem: Dário, o Grande, terceiro imperador persa

O governo de Dario (522–486) iniciou-se de maneira conturbada, visto que precisava se legitimar no trono e apaziguar os ânimos de súditos descontentes. Sobre o primeiro problema, vê-se que ele invocou, pela primeira vez no Império Persa, a figura divina e argumentava que ele próprio era o representante do Bom Senhor, Ahura Mazda (HOLLAND, 2008). Já para solucionar o segundo contratempo, Dario teve de passar dois anos lutando contra rebeldes espalhados por todo o território. Portanto, sua posição como chefe do território Persa foi definitivamente estabilizada somente em 520 a.C. (BRIGHT, 2003).

Como dito, Dario, o Grande, mostrou-se ser um líder tão bom quanto Ciro, o Grande, e foi responsável por enormes feitos, que englobam desde conquistas territoriais até desenvolvimento de sistemas de integração e comunicação. Foi durante seu reinado que a Pérsia atingiu seu auge.

Os feitos de Dario foram muitos e brilhantes: seus monumentos em Persépolis e outras localidades, o canal que ele construiu unindo o Nilo ao Mar Vermelho, o complexo rodoviário que facilitava as comunicações de uma extremidade à outra do império, seus amplas reformas legais, o aperfeiçoamento de um sistema padronizado de moeda (a cunhagem de moedas tinha começado na Lídia no século sétimo), o que muito contribuiu para promover o sistema bancário, o comércio, a indústria — e muito mais. (BRIGHT, 2003, p. 508)

Após seu falecimento, que o impediu de realizar um de seus planos mais ambiciosos, a conquista da Grécia, seu filho Xerxes (486–465) foi nomeado imperador. No entanto, seu governo foi o oposto do de seu pai, haja vista que foi marcado por derrotas. Além de ter de enfrentar diversas revoltas em territórios chave, como o Egito e a Babilônia, e não ser capaz de contê-las integralmente, Xerxes também fracassou ao tentar tomar para si o território grego. Ao ser assassinado, foi substituído por seu filho caçula Artaxerxes I Longimanus (465–424) (BRIGHT, 2003).

Diante da conjuntura em que o Império Persa vivia no momento, iniciaram-se especulações sobre seu fim. O governo de Artaxerxes I também foi marcado por muitas revoltas, especialmente na Síria, derrotas na Grécia e por perdas territoriais do Baixo Egito. Mesmo assim, o sucessor de Xerxes conseguiu garantir a sobrevivência do Império, que estava distante do seu fim. Com seu falecimento, seu neto Dario II Nothus assumiu a liderança da Pérsia, após assassinar seu pai, que era o herdeiro legítimo. Seu principal feito enquanto imperador foi reconquistar a Ásia Menor, por intermédio da utilização conjunta de virtù, ao que tange ao trabalho diplomático e pacífico, e Fortuna, haja vista que a Grécia estava enfraquecida durante o interregno da Guerra do Peloponeso e era marcada pela corrupção de seus agentes (BRIGHT, 2003)

O período sombrio e conturbado do Império Persa continuou sob o comando de Artaxerxes II Mnemon (404–358), que lidou com uma série de conflitos por toda a extensão do Império, desde a Síria e Babilônia até ao oeste do Rio Eufrates. Além disso, o Egito declarou-se independente, e assim permaneceu por 60 anos (BRIGHT, 2003).

Diante desse cenário caótico, a ascensão de Artaxerxes III Ochus (358–338) como imperador aparentava trazer momentos de alívio para o Império, haja vista que ele conseguiu não só conter as revoltas com uma postura assídua e violenta bem como retomar o controle sobre terras egípcias, encerrando, assim, seu breve momento de independência. No entanto, o rei persa foi assassinado por envenenamento, assim como o herdeiro do trono, seu filho Arses (338–336), e todos os seus netos. A morte dos futuros governantes da Pérsia adicionou mais um ponto para a instabilidade e ameaça da sua existência (BRIGHT, 2003).

Assim, diante da falta de herdeiros diretos, o sucessor do trono disponível foi o neto de um irmão de Artaxerxes II, Dario III Codomannus (336–331), o qual era, também, o último imperador persa. No mesmo ano de sua posse, assumia o comando da Grécia Alexandre (336–323), filho de Filipe, que entraria para a História como Alexandre, o Grande, um dos maiores conquistadores do mundo. Este, em apenas cinco anos, foi responsável por extinguir o Império Persa, ao iniciar suas investidas pela Ásia de domínio persa. Em seguida, conquistou toda a Ásia Menor, derrotando Dario III em batalha, o sul, especialmente a Palestina, e o Egito. Finalmente, ao chegar à Babilônia, Dario III é encontrado e assassinado levando consigo os mais de 200 anos do Império Persa. Alexandre anexou à Grécia o remanescente persa e, devido à uma doença, faleceu aos trinta e três anos, ainda na Babilônia (BRIGHT, 2003).

Referências:

BRIGHT, John. História de Israel. 9. ed. São Paulo: Paulus, 2003.

HOLLAND, Tom. Fogo Persa: o primeiro império mundial e a batalha pelo Ocidente. Rio de Janeiro: Record, 2008.

STEINMANN, Jean. O livro da consolação de Israel e os profetas da volta do Exílio. São Paulo: Edições Paulinas, 1976.

VENÂNCIO, Mariana Aparecida; VIEIRA, Geraldo Dondici. O Alvorecer de uma nova esperança: a ascensão do Império Persa e a Libertação de Israel. RHEMA — Revista de Filosofia e Teologia , [s. l.], v. 15, n. 48/49/50, p. 135–148, jan/dez 2011. Disponível em: https://seer.uniacademia.edu.br/index.php/RHEMA/article/view/148/0. Acesso em: 1 jul. 2022.

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Somos um Grupo de Estudos em Oriente Médio, idealizado por alunas do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

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